quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

Sorte

Essa vida não me parece justa,
mas sei também que isso é minha culpa
porque eu coloquei minha sorte em suas mãos
para que você me salvasse.

Deixei que você me conduzisse a um lugar
que não me importasse...
.
.
.
eu não sei como,
mas acho que já cheguei morto.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Vômitos Angustiados

A vela acesa no candelabro da sala
derrete pelo fogo que a consome
e que também queima minha alma
que cansada
deixa-se estar nas circunstâncias banais
e finais de tardes pungentes.

É dezembro
e o calor que emana dos seus olhos
não me aquece desse frio severo
que me imponho nesses versos.

sábado, 2 de dezembro de 2017

Reminiscência II


Os cômodos da casa não falam, mas é como se falassem,
como se contassem, em prosa, as histórias vividas
e hoje perdidas entre suas fendas e o vazio do ambiente;
da sua cor branca ou suja de lembranças
que sinto na intimidade forjada pelo acaso.

Os diálogos que ecoam pelo corredor, os passos que nunca mais chegarão:
o aroma do café pela manhã,
o beijo no canto da boca.
Antes, esse era um lugar calmo e bonito,
mas hoje é apenas calmo,
de uma calma sem paz,
de uma paz sem alma,
dessas que procuramos quando olhamos para dentro das igrejas
em imagens de santos tristes e rezas sem prece.

Hoje esse lugar é calmo, mas não parece.

domingo, 12 de novembro de 2017

Poema de Novembro

Somos feitos de poeira, ou éramos, pois não existimos
além dos sonhos que conservávamos e nutríamos em nosso íntimo.

Os dias passavam.como passavam navios para os naufrágios,
no lusco-fusco das nossas ilusões ingênuas:
olhares e sorrisos que não vimos!

Buscávamos, no entanto, sempre a poesia,
o poema marcado com nossas iniciais e gravuras tristes;
buscávamos, dentro de nós, a figura pacata da existência de algo que nos validasse
e nos desse sentido.

Viver era um merecimento,
que honrávamos em caminhadas silenciosas em nossas planícies,
em gestos humildes, em afagos incondicionais
em tardes debaixo das nossas árvores.

Mesmo assim, caímos em um sono em que não acordamos,
e deixamos de viver o eterno
para sempre.

domingo, 8 de outubro de 2017

Correntes


Às vezes não me mexo
e deixo escorrer lágrimas imundas em mim enquanto apodreço;
não olho para lugar nenhum senão para mim mesmo,
quando fecho os meus olhos e aí sim,
percorro descalço meus pântanos em busca de me cortar nos cacos que espalhei por mim.

 Nunca me cortei, mas sempre me feri.

Então, deixo-me sofrer pelas cicatrizes que não fecham,
feridas eternas que conservo em minha alma
esses poemas que me habitam e me dão forma;
a poesia que não cala, mas me conduz ao silêncio violento da sua ausência,
da falta, do grito que para no instante absoluto do nada.

Essa corrente na minha boca, em meus braços, pernas e asas.
Sim, asas,
que já não me servem para nada
a não ser sobrevoar meus sonhos insanos e interrompidos.

sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Aqui

Quando você passa por mim,
ou melhor,
quando você passa sobre mim,
não me nota,
pois minha presença não importa,
se desfaz na sua indiferença.

Minha voz é desconhecida
pois o silêncio é o que me manifesta
e mesmo minha existência já tanto faz.

Talvez seja pela íris dos meus olhos,
ou talvez pelo sopro de tristeza que exala pelos
meus poros;
quem dera ainda fosse qualquer coisa
e eu faria dela uma esperança para me agarrar,
me equilibrar e me livrar dos meus destroços.

Quem dera eu pudesse falar
para um par de ouvidos dispostos.

domingo, 10 de setembro de 2017

Linhagem nº...


O que me fere não tem corpo, mas se manifesta violentamente na minha paz;
quando somos tentados por anjos que caçoam do nosso abandono,
quando entoam uma canção antiga e exclusiva,
numa língua que não lembramos mais, mas que era nossa.

Nesse lugar não há aleluias ou milagres,
nenhum ser divino para nos livrar de um pecado que não é nosso,
mas que também não lembramos.

Assim as marcas se aprofundam na carne que nos constitui e nos reveste,
carne pela qual todos definhamos nessa eternidade podre como uma maçã,
mas que cheira a flores brancas.

Há uma tempestade vindo meus amigos:
meus olhos estão pesados e
eu não sei chorar...

domingo, 3 de setembro de 2017

Poeta

Queria ter sido poeta, 
desses de poemas fortes e ar bucólico, 
do andar cambaleante, 
de ir pelas nuances 
dos sentimentos que anseio sentir com o coração 
e pesar pela alma.

Quis ser poeta 
para transbordar a angústia e o desespero 
que, muitas vezes, 
guardei em segredo 
em uma caixa de madeira. 

Fosse eu poeta e teriam virado poemas. 

Não sou poeta, 
não ouso, 
mas se fosse, 
talvez eu pudesse dar um destino a esse vazio 
que trago comigo 
desde o íntimo da minha existência.

Não sou poeta, 
mas a poesia é a força que impulsiona minha insistência, 
esse corte na pele por onde saem as palavras
e o sofrimento persiste como fogo numa lareira.

domingo, 27 de agosto de 2017

Das de Amor


Que seus olhos me encontrem em algum lugar entre o santo e o perverso
e suas mãos me alcancem pela extensão desse universo
que nós conhecemos pela intimidade pungente em que nossas histórias foram escritas
em prosa e verso.

Pensa em mim no cair de um cometa, no apagar de uma estrela;
lembra da constelação que guiou nossa trajetória
e faz uma jura de que o amor é eterno.

Fecha os olhos para me ter mais perto
e caminha comigo pelos caminhos secretos da nossa linha do tempo;
beija o pingente que me representa
e permita que o infinito comece a transcorrer pela ampulheta que trago no meu bolso esquerdo.

Vive mais um dia, amor, na graça que se faz de cada momento da sua presença
e entende que a eternidade não basta,
que é preciso sentir com veemência
toda essa chama que nos derrete e jamais se apaga.

sábado, 5 de agosto de 2017

Y4


Da palavra que sai da tua boca, o som que confronta minhas ideias
e que me afasta de onde eu nunca quis estar,
mas me encontro por não saber o que sou.
É na hora da comunhão 'onde' me sinto mais longe e ausente de mim
e as distâncias significam uma negação de todas as coisas com as quais eu me identifico.

Assim, quando chove, eu me recolho sozinho a ficar imaginando os dias passando como uma nuvem cinzenta e perfeita.
Quando chove eu sou feliz, pois se percebe os silêncios nas casas e nas ruas
e todo o mundo parece estar numa única oração.
Nesses momentos eu me deixo estar, ouço a chuva como se fosse uma música divina,
e se eu acreditasse em divindades, então eu seria uma,
pois permito calar meus sentimentos e jorrar-me em gotas puras e idênticas.

Cai a tempestade e eu ascendo à minha glória.

terça-feira, 25 de julho de 2017

Enxaqueca


A Enxaqueca se faz presente
e requer de mim toda atenção que posso lhe dedicar.
Quando ela chega, é por trás da minha cabeça,
lentamente e sorrateira
me calando e me controlando de todas as maneiras.

Posso dizer que somos velhos conhecidos,
e de certa maneira,
somos íntimos.

Ao se alojar no meu lado esquerdo,
sei do tempo eterno que escorrerá pelas paredes
até inundar esse lugar com sua presença
severa,
intensa
e fazer em mim
seu lugar favorito.

quinta-feira, 13 de julho de 2017

Abatido

Sei que existo porque sinto
mesmo que o que eu sinta seja qualquer coisa que você julgue inexpressiva
na sua consciência arrebatadora,
sangrenta e doentia.

Não dói mais em você do que em mim,
ainda que eu não expresse nada do que você compreenda
porque meu sofrimento não é nada
e é da minha carne que você se alimenta.

Por que minha lágrima não comove,
nem minha existência é nada para os homens?

Por que me abatem?

Toda minha existência termina em um golpe
de estupidez e vergonha
que a sua consciência ainda não alcançou,
mas que me fere na cabeça e macula meu coração.

É, no entanto, na alma onde dói mais,
onde esse sentimento queima
todas as angústias existentes da minha vida.

sexta-feira, 30 de junho de 2017

Aurora

Onde eu estive ontem, não trago recordações. eu vaguei por diversas paisagens: observei árvores e as aves do céu. Cambaleei em rochas e indagações filosóficas. Eu vi então a Aurora e, com ela, se dissipar tudo aquilo que eu sentia; Não houve misericórdia! Participei do fim do mundo e não esbocei qualquer reação, já que a chuva caia sobre mim sem ao menos me levar do purgatório intenso da minha existência. Fechei os meus olhos e fingi que estava em algum deserto e, quando acordei, lavei meu rosto em lágrimas e torci para eu não acontecer de novo.

sábado, 24 de junho de 2017

Anoitecer

Ao abrir os olhos míopes,
encarou o teto do seu quarto como se ele fosse desmoronar.
Depois, ainda com os pensamentos confusos,
levantou-se e dirigiu-se ao banheiro com seus passos indecisos.
Lavou seu rosto com água fria, girou os olhos
e preparou-se para a agonia de mais um dia.
Deliciou-se com algumas xícaras de café enquanto olhava o nada pela janela,
uma ou outra nuvem elétrica.
Imaginou a si mesmo caminhando por elas,
descobrindo novas paisagens, outra atmosfera.

Sorriu, como há muito não fazia.

Revisou planos, analisou possibilidades.
Abriu mão de todas.

A tarde passou como uma flecha cortando o ar e, por muitas razões,
temeu a noite que se anunciava.

Então anoiteceu . . .

terça-feira, 13 de junho de 2017

Tarde de Domingo

 Vestidos de branco, usando óculos sexy,
nós passaremos toda uma tarde de domingo caminhando por um parque vazio;
alimentaremos as pombas com os pedacinhos dos nossos corações despedaçados.
 Sentaremos em um banco e, cansados,
falaremos de um futuro qualquer,
desses que nunca vem.
 Faremos também promessas e algumas adivinhações
para, depois, exaustos,
dizermos as palavras que julgarmos desnecessárias.
 Então
nós nos afastaremos
e seremos apenas lembranças em algumas ocasiões.

quarta-feira, 31 de maio de 2017

Y1


Vai passar por mim
as sensações indizíveis de estar presente na ausência
em que os resquícios da melancolia escorre pelos meus olhos
que avista, quando olha para dentro, a tristeza incompleta do nascimento do fruto do amor;
Cai no coração a incapacidade da minha fala
que engulo seco,
me desce pela garganta e me cala.

Eu que me calo e me distancio,
caminho pelo infinito abismo da minha alma,
que vaga.no vácuo do meu sofrimento
que me consome palavra por palavra.

quarta-feira, 17 de maio de 2017

31 e 2

Já voei quando eu tive asas, mas as cortei por não querer mais voar.
Apaguei a constelação do meu zodíaco
e assumi para mim o meu destino.
Quando me mutilei era domingo,
que não guardei
como qualquer outro.
Jurei que meu coração bateria livre,
mas o aprisionei no tempo das minhas memórias tristes,
na masmorra do meu sofrimento celeste
em que eu chorei lágrimas imundas e caminhei por vazios existenciais
no silêncio dos labirintos da minha mente.
Nunca me perdi,
mas me afastei para que, assim, eu pudesse me reconhecer
nos sulcos do meu rosto,
marcas que coleciono.

Então o tempo passou, como antes, e dessa vez eu o senti.

Deixa o tempo penetrar na carne,
envenenar o sangue, corromper o corpo
e lembrar que certa vez fui amado em um dos meus sonhos,
mas quando acordei
já era tarde demais.

domingo, 23 de abril de 2017

Reminiscências II


 Os cômodos da casa não falam, mas é como se falassem,
como se contassem,
em prosa,
as histórias vividas e hoje perdidas entre suas fendas e o vazio do ambiente,
da sua cor branca ou suja de lembranças que sinto na intimidade forjada pelo acaso.

 Os diálogos que ecoam pelo corredor, os passos que nunca mais chegarão:
o aroma do café pela manhã,
o beijo no canto da boca.

 Antes, esse era um lugar calmo e bonito, mas hoje é apenas calmo,
de uma calma sem paz,
de uma paz sem alma,
dessas que procuramos quando olhamos para dentro das igrejas,
em imagens de santos tristes e rezas sem prece.

 Hoje esse lugar é calmo, mas não parece.

segunda-feira, 10 de abril de 2017

Os meus dias de chuva!


 É um dia comprido, frio e sem perspectivas; é domingo e meu passatempo é olhar as folhas das árvores balançarem com o vento gelado que sopra lentamente. Chega a ser bonito de tão triste.
 Particularmente eu gosto muito de dias assim, da paisagem bucólica que o frio do inverno proporciona. Hoje está chovendo; não uma chuva forte, torrencial, mas sim uma chuva tranquila e contínua. São exatamente nesses momentos que meu coração ironicamente se aquece e eu, eufórico, permito que um sorriso tímido forme-se em meus lábios e instale-se em meu rosto. Geralmente eu paro tudo o que estou fazendo para acompanhar a chuva; também não penso em coisa alguma: é só o olhar bonito de uma queda d'água.
 Então eu debruço sobre a janela e entrego-me de todo espírito e coração à pureza e beleza desse momento. De uma forma 'egoísta', gosto de pensar que esses dias são meus. Assim, debruçado na janela, eu contribuo com a chuva e também derramo lágrimas do meu rosto que se misturam a água cinza da chuva. Nesses momentos eu tenho plena convicção de que não há mais nada bonito na natureza do que uma chuva tranquila num domingo frio de inverno. Eu estou sozinho e sinto uma vontade honesta de não ver mais nada depois disso, de não sentir mais nada depois dessa felicidade. Honestamente eu não sei o que será de mim quando a chuva diminuir gradativamente até cessar, tão pouco saberei viver quando o sol estiver alto e imponente no céu, iluminando e aquecendo a todos. Fosse por mim e essa chuva duraria por toda a eternidade; fosse por mim e eu sairia às planícies que avisto da minha janela e percorreria toda sua extensão.
Quem dera eu tivesse um cajado...
 Por uma fracção de segundo eu cogito deixar tudo o que me envolve, abandonar toda mediocridade que acarreta a minha existência e tornar-me parte dela. Não há comodidade que me convença do contrário ou medo que me impeça de seguir em frente.
 Eu então saltei da janela para me tornar eterno e algum tipo de lembrança incômoda. Logo serei esquecido e poderei finalmente ascender aos céus.

sábado, 1 de abril de 2017

32 de Março

Pouco espero de mim por pouco saber quem eu sou.
Hoje é o dia de lamber as feridas, de fazer juras impossíveis e infinitas.
Irei à montanha isolar me do mundo, colher flores e alguns frutos silvestres,
depois cuidarei para que a vida não seja esquecida.
Escreverei lembranças na minha pele.
Buscarei a harmonia em todas espécies.em mim,
na decorrência dos dias que tecem sentimentos que desconheço
e me dominam.

Nada mais foi sofrimento depois disso.

segunda-feira, 27 de março de 2017

1992


 O que é o tempo? Seriam as rugas na pele do meu rosto, alguns fios de cabelo branco?

São as rachaduras nas paredes, os nomes que esqueci, momentos que deixaram de ser meus pois me deixaram.
É a limitação mais severa do meu corpo, a incapacidade de olhar para a vida em perspectiva; hoje só olho em amarga retrospectiva. O distanciamento abstrato do que me constituía.
Eu estou diferente, embora eu seja o mesmo; quando olho para as estrelas,
minha vontade é ser poeira entre elas.
Veja minhas mãos, elas tremem!, mas meus passos sempre foram firmes.

O tempo é uma tristeza, uma impermanência de espírito.

Ainda assim, gosto de pensar que é 1992, seja 1992 apenas um signo para eu rastrear minhas lembranças. Preenchi as lacunas com o que encontrei pelo caminho: poesia, música ambiente, livros...
mas talvez eu não estivesse em nada disso.

O que se apresenta agora é minha angústia em forma absoluta, mas minha angústia sou eu em pleno domínio de mim mesmo.
Antes eu não sofria como hoje sofro, mas me alegro por ter a certeza de que hoje não me escondo em sonhos em preto e branco ou em tardes laranjas; hoje eu posso sentir o tempo no meu sofrimento, nos vãos entre meus dedos,
na dor que petrifica meu coração em silêncio.

Hoje sinto o tempo no meu sofrimento, nas datas presas no calendário do ano da graça de 1992.

Como faz tempo...

sexta-feira, 17 de março de 2017

Apostasia

Oh - campos infinitos dos meus sonhos impossíveis,
verde vivo que me indica a consciência,
sou eu o escolhido?
Eu que acolho a tristeza e transformo as angústias em cores para os versos dos poemas que escrevo sem a pretensão de que sejam lidos;
eu que percorro a existência e atravesso a vida como um cometa,
busco nos céus o conforto para meu sofrimento num total ato de desespero.

Eu não acredito em mais nada, tão pouco em mim mesmo,
pois meu coração está seco e o milagre não se faz sozinho.

Oh - verdes campos, sou tão infinito quanto o tempo,
e não há nada que mude isso, e nem deveria.

Veja, uma estrela,
mas sua luz não ilumina.

quinta-feira, 9 de março de 2017

Fenda


 Às vezes, não sempre, eu me sinto a beira de um colapso, desses que fazem uma cisão e fecham algumas portas.
Eu tenho as chaves, mas nunca as respostas.

 Quando tento encontrá-las, me perco ainda mais e morro afogado nas águas calmas do meu íntimo, eu que vivo numa tormenta.
 Eu tento encontrar a mim mesmo para então me afastar num caminho sem volta.

 Nunca há volta!

 Quando parto de mim é para me esquecer e deixar crescer a ausência que plantei no jardim secreto do meu coração ferido.
 Estou ferido porque eu me feri e, às vezes, me firo, mas não sempre, que é para que essa cicatriz não feche, mas a ferida seja um adendo.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Vento


O vento passou pela janela
e fez balançar a cortina branca suavemente.
Eu que me afasto de simbolismos,
quis acreditar que o vento soprava boas novas,
mas seu uivo não dizia nada disso;
que soprasse algum conforto
ou alguma expressão de alívio!

Ai de mim
quando me traio nas esperanças da madrugada,
no silêncio castigador,
insônia bendita.

O sofrimento que se torna poesia!

Eis me aqui de novo,
a derramar as lágrimas que nunca são necessárias
para que eu chegue a mim,
eu que me distancio e pouco me conheço,
sei apenas que vivo por viver,
ao atravessar o tempo em suas brechas finas
e contar os dias com uma dor de pesar.

O calendário sempre aponta a data errada,
os rostos das pessoas mudaram
e os antigos transitam pelos meus sonhos.

Não há mais qualquer pesadelo que eu não tenha vivido
ou alguma lembrança que eu consiga esquecer.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Praça do Carmo


 O céu está cinza e as nuvens pesadas, mas a chuva que se anuncia não cai. Os bancos de madeira ficam espalhados nessa praça; os pombos, comuns como em qualquer lugar, se agrupam na grama verde e ignoram as pessoas sem rostos. Os holofotes foram acesos, mas não há nada para iluminar, a não ser o pensamento que se esvai.
 Eu estou sentado sem saber exatamente o que estou sentindo: além do vazio corriqueiro, é o abandono que me domina e faz a angústia saltar a boca, esse eterno azedume que trago comigo. Sou incapaz de mover meus lábios e cínico demais para ficar perplexo. Somente acompanho esse deslizar lento dos fatos com os olhos pesados e míopes.
Faz frio, mas não trouxe casaco.
Às vezes é preciso senti-lo além dos sentidos, permitir que as sensações extrapolem o compreendido; o movimento das árvores com o vento é o mesmo ao que me atento.

Às vezes é preciso estar perdido para retornar a si mesmo.