segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Vento


O vento passou pela janela
e fez balançar a cortina branca suavemente.
Eu que me afasto de simbolismos,
quis acreditar que o vento soprava boas novas,
mas seu uivo não dizia nada disso;
que soprasse algum conforto
ou alguma expressão de alívio!

Ai de mim
quando me traio nas esperanças da madrugada,
no silêncio castigador,
insônia bendita.

O sofrimento que se torna poesia!

Eis me aqui de novo,
a derramar as lágrimas que nunca são necessárias
para que eu chegue a mim,
eu que me distancio e pouco me conheço,
sei apenas que vivo por viver,
ao atravessar o tempo em suas brechas finas
e contar os dias com uma dor de pesar.

O calendário sempre aponta a data errada,
os rostos das pessoas mudaram
e os antigos transitam pelos meus sonhos.

Não há mais qualquer pesadelo que eu não tenha vivido
ou alguma lembrança que eu consiga esquecer.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Praça do Carmo


 O céu está cinza e as nuvens pesadas, mas a chuva que se anuncia não cai. Os bancos de madeira ficam espalhados nessa praça; os pombos, comuns como em qualquer lugar, se agrupam na grama verde e ignoram as pessoas sem rostos. Os holofotes foram acesos, mas não há nada para iluminar, a não ser o pensamento que se esvai.
 Eu estou sentado sem saber exatamente o que estou sentindo: além do vazio corriqueiro, é o abandono que me domina e faz a angústia saltar a boca, esse eterno azedume que trago comigo. Sou incapaz de mover meus lábios e cínico demais para ficar perplexo. Somente acompanho esse deslizar lento dos fatos com os olhos pesados e míopes.
Faz frio, mas não trouxe casaco.
Às vezes é preciso senti-lo além dos sentidos, permitir que as sensações extrapolem o compreendido; o movimento das árvores com o vento é o mesmo ao que me atento.

Às vezes é preciso estar perdido para retornar a si mesmo.