sábado, 26 de janeiro de 2019

Poema n°4 (AFdL).

São poucas horas até elas descerem ao nível do mar,
ao encontro das tormentas
que nos chama pelos nomes de batismo,
que nos cobre e nos envolve do sal que nos alimenta,
que nos preserva atentos,
mas atônitos
nesse azul dos céus tão intenso,
azul distante como as lembranças que refuto,
as distâncias
e meu sofrer fajuto
as distâncias em concordância
sobre a dor que projeto
nas nuvens,
como se as nuvens movimentassem
o tempo,
como se meus olhos
suportassem um cílio.

eu vou inundar esse lugar!

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

Compreensão

Que eu compreenda meu sofrimento,
e após compreendê-lo,
eu possa alocá-lo
em algum lugar quente
do meu coração,
não para cultivá-lo,
mas para que eu nunca me esqueça
do que fui capaz para suportá-lo.

Queria, ao olhar para dentro,
ver como me apresento,
ouvir minha própria voz
fora de mim
e me dar as chances
que eu tanto recuso,
mas que mereço.

A vida segue como um rio
e como os pássaros
rumam para um lugar melhor,
de acolhimento;
quando a vida não segue,
os significados falham
e o vazio permeia os sentimentos.

Que eu me livre de todos eles!

segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

Madrugada

Não consigo
ir além de mim mesmo,
das limitações que me imponho
porque me dizem.
Meus sonhos
cabem todos
dentro de uma concha,
mas eu choro oceanos
e 7 mares de ressaca.
Espero cada naufrágio
como se a cumprir os presságios
das cartas,
as profecias daqueles que não falam,
mas vomitam palavras.
Meus sonhos
consomem todo o universo,
mas o céu acima é tão impossível,
e as nuvens e também as aves
livres de qualquer consciência.

Tenho sono e tenho sonhos,
mas não é tempo de colheita.

sábado, 12 de janeiro de 2019

Resquícios #85

O salto de cabeça
é em direção ao concreto
cinza
das ruas
da cidade
na certeza
que tocará o chão
com a violência
da queda;
com a violência
do desprezo
das pessoas
que o ignoram
numa tarde de terça.

Deixa o sangue escorrer
até sexta.

Deixa.

terça-feira, 8 de janeiro de 2019

10°

Corro
mas não corro das coisas
que me acontecem, como se fugisse,
mas sim vou ao encontro das coisas
que estão para acontecer; momentos inéditos.

Nenhum desses acontecimentos
requer minha presença,
mas me encanta as luzes e as cores
na possibilidade de ver nascer uma estrela, à meia noite
de algum ponto fixo do universo,
que me encanta percorrê-lo
e chegar a cada canto
que eu ainda não conheça.

Desejo ir, mas nunca partir:
que eu nunca esqueça!

domingo, 6 de janeiro de 2019

Linhagem 24


Na exatidão do tempo, 
na precisão cirúrgica em que ele se movimenta, 
na certeza que nos vence e sufoca a esperança, 
nós continuamos perdidos no medo, 
naquele vazio que se instala em nossas almas 
e nos faz pequenos. 
Não olhamos para trás, 
nós nunca olhamos para trás, 
mas quando olhamos para frente 
nos falta a convicção necessária:  
o desejo não é o suficiente.
É preciso derramar sangue e lágrimas; 
é preciso uma daquelas guerras cruéis e nefastas 
que devastam qualquer coisa. 
É preciso, na hora da amargura, 
alguém que nos conduza de volta para casa.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

Poema 37


Eu vivo, não mais por viver
ou qualquer outro motivo,
eu simplesmente vivo
como as demais formas de vida que vejo
e que sentem
assim como você sente,
como eu sinto
porque comem quando têm fome,
dormem quando estão exaustos;
também choram às vezes
sem que ninguém veja,
mas sofrem sem que você perceba.

Quando me dou conta
de que a vida que vivo é minha,
vivo mais,
vivo de maneira plena .

Eu falo sobre vida,
dessa que acontece na minha ausência,
essa que alguns pensam que é comida,
daquelas que eles pensam que só serve para os servir
sobre uma mesa.

terça-feira, 1 de janeiro de 2019

Caderno

Escrevo versos ilegíveis e incompletos 
por todo meu caderno
de capa dura.
As palavras perambulam avulsas
de página em página
até à última.

Seus versos quilométricos,
o caderno
de páginas com desenhos
e rascunhos,
alguns planos audaciosos
e tantos outros absurdos.

Nomes numa lista,
items de supermercado,
números
e soluções que abreviam o futuro:
há um verso ilegível e incompleto,
de significado oculto
e que jamais será descoberto.